Por Leticia Sangaletti
Você já parou para pensar no impacto das palavras não ditas? Quantas vezes você supôs que alguém entendeu seu recado, percebeu seu cansaço ou sabia o quanto você se importava?
Anteriormente vimos que a verdade é que, na comunicação, o óbvio só é óbvio depois que é dito. Mas e quando ele não é?
Se o óbvio precisa ser dito, então por que tantas pessoas preferem o silêncio? Em alguns casos, o silêncio é estratégico e bem-vindo:
✔ Silêncio reflexivo – Pausas em uma conversa podem ajudar a processar melhor o que foi dito.
✔ Silêncio respeitoso – Quando damos espaço para o outro falar sem interromper.
✔ Silêncio de conforto – Quando a presença é suficiente para demonstrar apoio.
Porém, na maioria das vezes, o silêncio destrói relações porque cria suposições erradas. “Se ele não respondeu minha mensagem, deve estar me ignorando”; “Se ela não disse nada sobre o jantar, é porque está tudo certo”. “Se meu chefe não me deu feedback, significa que meu trabalho está ruim”.
. Quando não dizemos o que pensamos, corremos o risco de deixar o outro construir uma narrativa totalmente diferente da realidade. E é assim que permitimos que o cérebro preencha lacunas com interpretações próprias, muitas vezes distorcidas e errôneas, pois nem tudo é sobre nós ou o meio em que estamos inseridos. Às vezes o problema do outro é com ele mesmo.
Importante ponderarmos também, que a ilusão de que algo é óbvio parte de um erro de julgamento conhecido como viés da transparência, que nada mais é do que a crença de que nossas intenções e sentimentos são evidentes para os outros. Mas não são.
Lembre-se: O que é óbvio para você pode não ser para o outro. E isso vale para a vida pessoal e profissional. Isso acontece porque cada pessoa tem uma bagagem única. Nossa forma de interpretar o mundo vem de nossas experiências, cultura e educação (falamos um pouco disso, não é?!). O que parece claro para você pode ser completamente novo para outra pessoa.
Você sabia que no Japão, discordar diretamente pode ser visto como rude, então as pessoas costumam dizer frases indiretas como “Isso pode ser um pouco difícil no momento”. Já nos Estados Unidos, espera-se que a comunicação seja direta e objetiva. No Brasil, usamos muitas entrelinhas e indiretas, esperando que o outro “pegue no ar”, ou que seja a mãe Dinah mesmo.
A forma como nos comunicamos está diretamente ligada ao ambiente onde crescemos. E é por isso que presumir que o outro entendeu é um equívoco.
Mas afinal, o que acontece quando o óbvio não é dito? A falta de clareza na comunicação pode gerar desgastes emocionais e profissionais. O simples ato de expressar o que pensamos pode mudar o rumo das coisas.
Então atenha-se a ideia de que dizer o óbvio não é redundante, mas necessário! Quando deixamos de falar, damos ao outro o poder de interpretar nossa ausência de palavras da maneira que quiser. Marshall Rosenberg, criador da Comunicação Não Violenta (CNV), nos ensina que comunicar-se bem não significa apenas falar, mas falar com clareza e empatia. Ele propõe um modelo simples para evitar ruídos:
Observação: Expresse o que você percebe sem julgamentos.
Sentimento: Diga como aquilo te afeta.
Necessidade: Explique por que isso é importante para você.
Pedido claro: Faça uma solicitação específica.
Errado: “Você nunca me escuta!”
Certo: “Quando tento falar e não sou ouvido, me sinto frustrado. Podemos encontrar um jeito melhor de conversar?”
Quando usamos esse modelo, evitamos mal-entendidos e tornamos a comunicação mais eficaz.
O que você ainda não disse hoje?
Sim, vamos repetir: O óbvio tem que ser dito. Mas da maneira certa. Não basta apenas jogar as palavras no ar, é preciso garantir que a mensagem seja compreendida. Então, antes de presumir que algo está claro, pergunte-se:
✔ “Eu realmente disse isso ou apenas achei que o outro entenderia?”
✔ “Minha mensagem está sendo clara e objetiva?”
✔ “O outro lado tem a mesma referência que eu ou preciso explicar melhor?”
A comunicação eficiente não é um dom, mas uma prática diária. Por isso, desafio você hoje: Experimente dizer claramente algo que você normalmente deixaria subentendido e veja como a comunicação pode mudar.
Talvez alguém esteja esperando por palavras que, para você, sempre pareceram óbvias.
Leticia Sangaletti
Jornalista (UFSM) e Dra. Em Letras (UFRGS)
@lesangaletti