Por Gabriela Streb
Quem não se lembra de como eram as visitas antigamente? Nem todo mundo tinha telefone, e vídeo chamada existia apenas nos desenhos dos Jetsons. Simplesmente se aparecia.
Antes do passeio, havia o sermão sobre o bom comportamento: “Não peça para beber nem para comer. Sente-se como uma menina, não peça para ir ao banheiro. Entendeu, Gabriela? Sei que você é uma ‘relações públicas de banheiro'”. Como assim? Eu não ia passear no banheiro; era uma necessidade.
“Se for brincar, não se suje nem fique suada; você está de roupa boa.”
Havia a roupa de ficar em casa, o uniforme escolar e a roupa de sair aos domingos ou para festas como aniversários.
Ganhei uma bota ortopédica branca que parecia um coturno de tão horrível. Durante um certo período da minha vida, meu irmão, meus primos e eu tínhamos que usar a tal bota. Por alguma razão, minha mãe e minha tia achavam que tínhamos pés tortos.
Uma vez ao ano, nos levavam à Sapataria Correto em Porto Alegre. Sentávamos em uma cadeira que parecia de engraxate e o contorno dos nossos pés era desenhado sobre uma lousa. Depois de um tempo, as botas ficavam prontas. Os pés não podiam crescer, pois iríamos ficar um bom tempo com aquela numeração.
Apesar do sermão prévio, o aniversário dos meus primos era sinônimo de correria e brincadeiras. Eu, de vestido impecável e com as tais botas, passei a tarde correndo, subindo e descendo um muro salpicado, brincando de pega-pega e esconde-esconde, escorregando os pés na mureta. Claro que o resultado foi catastrófico: as botas ficaram completamente lixadas. Talvez tenha sido aí que minha mãe desistiu das botas e resolveu me colocar no balé em busca de pés retos.