Por Antonio Tozzi
A escolha de Sofia na Argentina
No domingo, 19 de novembro, os eleitores argentinos vão às urnas para eleger seu novo presidente. De um lado, Sergio Massa, peronista e atual ministro da Economia do governo Alberto Fernandez, um dos responsáveis pela inflação que assombra o país ao atingir incríveis 80% ao mês. De outro, o anarcocapitalista Javier Milei, que fez sua campanha apoiado em ideias controversas como dolarização da economia, privatização de empresas estatais e extinção do Banco Central.
O que podemos dizer é que o eleitorado está diante de uma verdadeira “escolha de Sofia”, em referência ao episódio vivido por uma mãe judia na época da Alemanha nazista. Ela embarcava em um trem de refugiados com o filho mais velho e com a filha mais nova em seu colo, quando foi confrontada por um soldado nazista que lhe disse: “Você só pode embarcar com uma das crianças”. Incrédula, ela tentou argumentar que isto não seria justo, mas o soldado estava inflexível. Ou ela aceitava a decisão ou ninguém embarcaria. A cena do filme estrelado por Meryl Streep é compungente com a menininha chorando e clamando pela mãe, enquanto a mãe chorava na plataforma da estação segurando seu filho pela mão, porque ela sabia que o destino da pobre criança seria ser morta em um forno em Auschwitz.
Guardadas as devidas proporções, o destino da Argentina parece similar ao da mãe judia, que teve de decidir em poucos minutos o destino de seus dois filhos. Se elegerem Massa, as perspectivas serão sombrias porque ele deve aplicar o mesmo receituário amargo que levou o país ao empobrecimento da população e à irrelevância no cenário mundial e mesmo no cenário latino-americano, pois o país que se destacava por ser um dos mais ricos do mundo no início do século vinte agora padece por causa de políticas sociais equivocadas e por decisões econômicas errôneas.
No caso de Milei ser o escolhido, um grande ponto de interrogação tomará conta do povo argentino, dos analistas políticos e da comunidade econômica internacional. Ele vai mesmo cumprir essas promessas ousadas ou o discurso revolucionário foi adotado apenas para conquistar corações e mentes de pessoas insatisfeitas com as atuais condições de vida do país? Ele romperá mesmo relações com os governos chinês e brasileiro, uma vez que China e Brasil são os principais parceiros comerciais da Argentina?
Enfim, o governo de Milei será uma incógnita. Mas uma coisa é certa: sua eleição significará uma profunda mudança no panorama da América do Sul. E pode representar até a morte do Mercosul, pois seria mais um governo de direita na região, somando-se aos governos do Uruguai e do Paraguai. O Brasil, dessa maneira, seria o único governo de inclinação esquerdista. Aliás, todos sabem que o governo brasileiro vem dando apoio logístico e, dizem, até financeiro à campanha eleitoral de Sergio Massa, pois isto representaria um fortalecimento da frente ideológica no Cone Sul da América do Sul.
Milei, no entanto, obteve alguns apoios importantes, como a adesão da candidata Patricia Bullrich, que ficou em terceiro lugar no primeiro turno, e políticos latinoa-americanos de destaque, como Mauricio Macri – ex-presidente da Argentina (2015-2019); Felipe Calderón –ex-presidente do México (2006-2012); Vicente Fox – ex-presidente do México (2000-2006); Iván Duque Márquez – ex-presidente da Colômbia (2018-2022); Andrés Pastrana – ex-presidente da Colômbia (1998-2002); Mariano Rajoy – ex-presidente do Governo da Espanha (2011-2018); Jorge Quiroga – ex-presidente da Bolívia (2001-2002); Sebastián Piñera – ex-presidente do Chile (2010-2014; 2018-2022); Luis Fortuño – ex-governador de Porto Rico (2009-2013), e Mario Vargas Llosa – político e escritor peruano, derrotado em uma eleição no Peru por Alberto Fujimori.
Segundo as pesquisas, Massa se saiu melhor no último debate presidencial, mas o resultado que vale mesmo é o das urnas e o país está dividido, assim como ocorre na maioria das democracias ocidentais, Brasil e EUA estão entre elas.
Como vizinhos e observadores, só nos resta torcer para que o vencedor consiga reverter esse cenário trágico que domina a Argentina, um país com bons índices de educação, mas que vem sendo vítima do populismo que tomou conta do país desde o governo de Juan Peron. Suas políticas sociais em favor dos mais pobres, protagonizadas pela então primeira-dama Evita Peron, conquistaram os argentinos. Entretanto, o fantasma de Peron assombra a Argentina. Criou-se então o movimento peronista que visava dar continuidade à linha política do falecido presidente argentino. Porém, o movimento se desvirtuou e se tornou bandeira de luta dos esquerdistas argentinos, com o casal Nestor e Cristina assumindo o poder e transformando o país em uma nau sem rumo.
Agora, os dois candidatos prometem mudanças. Milei, com seu discurso anárquico, e Massa, renegando seu passado peronista para ver se reconquista o desconfiado eleitorado argentino.
Somente o resultado das urnas de domingo apontará o rumo do futuro da Argentina, com o morador da Casa Rosada ditando os destinos de uma nação que tem tudo para se reerguer.