Por Claudia Zogheib
Laços de família, laços afetivos, laços de amor! Não precisamos avançar muito nestes exemplos para perceber a ambiguidade da palavra laço: pode conectar dois ou mais entre si, salvar, confortar, assegurar, tranquilizar, e pode também: amarrar, acorrentar, constranger, limitar, incomodar. Vivido de forma errada no lugar errado torna-se doentio e desconfortável: há ambiguidade nos laços.
Freud sempre orientou sua escuta na fala de seus pacientes em torno dos conceitos fundamentais de sua teoria particularmente atento a forma como se aparelhavam, como se enlaçavam: o eu com o outro, com o sentido da vida, com o próprio corpo. Os conceitos de sintoma, pulsão, identificação, ideal de ego, ego ideal, transferência, amor, etc. permitiram-lhe não somente rastrear as dificuldades nos laços que seus pacientes apresentavam, mas proporcionou a partir de então, uma leitura mais precisa dos fenômenos coletivos.
As formas de estruturação da subjetividade humana, pensada por condições de existência socioculturais e econômicas, tem interferido muito no sentimento de confiança entre os indivíduos, fazendo com que as pessoas estejam cada vez mais solitárias, imersas em suas preocupações e ideias, deixando como consequência vidas pouco compartilhadas, laços mal atados, solidão, esta não entendida por estar só, mas por se sentir só, mesmo estando perto de pessoas.
A psicanálise é uma experiência a qual se chega também pelo sofrimento do desenlace: com o corpo, com o outro, com o vazio, e prossegue pela demanda que faz apelo a si diante do outro, portanto, pela necessidade de criar laços. A transferência em si já é um laço, e diante das experiências individuais de cada um, os laços vão construindo seus próprios caminhos e percepções.
O amor na psicanálise é aquilo que enlaça o sujeito com o outro semelhante desde a sua constituição até o desenrolar de toda sua narrativa enquanto vivo, que enquanto demasiadamente idealizado, escraviza e adoece, que enquanto passagem do amor idealizado para o amor real, desamarra o sujeito do nó, do sintoma, e lhe devolve a liberdade de criar laços possíveis, livre do adoecimento.
Na experiência humana, os laços tendem a nos mostrar o quanto podemos aprender com a experiência de troca com o outro. Somos seres transientes, elos em uma mesma cadeia. Recebemos dádivas, e somos doadores. E quanto mais estreitamos os laços preservan犀利士
do a nossa essência, mais realizamos experiências de trocas que transformam: vivam os laços de qualidade.
“Você tem que estar preparado para se queimar na sua própria chama:
como se renovar sem primeiro se tornar cinzas?”
Nietzche
É possível: morrendo e nascendo de si mesmo!
Em tempo, este texto foi escrito ao som da música “Um a Um”, ao vivo de Tribalistas.
3 Comentários
Parabéns a autora deste belíssimo texto. Fazia tempo que não saia nada, que bom que voltou a ter textos.
Em outubro a revista esteve fora do ar passando por reformulações técnicas.
Obrigado pela leitura.
Ialdo Belo
Obrigado, estamos por aqui!